
Processos da vida cotidiana
Somos pressionados o tempo todo – ou imaginamos que somos – para concluirmos as mais diversas tarefas e obtermos os resultados.
A impressão que tenho é que quando estamos fazendo essas atividades, nosso imaginário está preso no final, no futuro, consequentemente, no que não existe.
A consequência desse fato é a falsa sensação de que a vida passa depressa demais.
Apesar de alguns afirmarem que isso é real e que há explicações astrológicas e do universo, a verdade é que os minutos ainda têm os mesmos sessenta segundos. É só você parar, olhar e confirmar!
A experiência humana de não vivenciar os processos de maneira presente e intensa, traz muitas vezes uma angústia, uma falta de sentido que se concretiza pelo sentimento de ansiedade – comum na sociedade contemporânea.
As pessoas correm, estão sempre querendo algo, sofrendo para alcançar os resultados, mas poucas vivenciam o tal do processo.
O tal processo…
O maior problema em viver dessa maneira é que o apego exagerado aos resultados, geram expectativas que podem não ser supridas e acabam em frustrações recorrentes, o que além da ansiedade, pode gerar também sentimento de tristeza.
E assim desenvolvem-se as neuroses no nosso tempo, que um dia serão documentadas, historiadas e talvez olhadas com espanto por outros povos que conseguiram superar a fascinação pelo fim.
Mas é possível viver o processo de maneira mais intensa, os nossos processos, nossos movimentos, o movimento humano, afinal, é disso que a vida é feita – de processos.
Na arte isso fica mais claro, muitas obras, para serem o que são hoje, tiveram processos complexos e longos.
Michelangelo vivenciou um longo processo para a pintura da Capela Sistina, quatro longos anos para o resultado de uma das obras de arte mais clássicas da história do mundo.
Já que somos mestres em imaginar, imaginem então todo o processo dessa tarefa, o cotidiano, os detalhes a história, ou seja, o sentido dessa obra.
Enfim, o sentido! É esse o ponto que precisamos refletir, é preciso buscar o sentido no fazer, no que é real e não no que está por vir.
Encontrar o sentido do fazer pode ser uma das estratégias para uma vida com experiências mais significativas. Lembremos de Viktor Frankl.
Apaixonar-se pelo processo das nossas tarefas, das mais simples às mais complexas, vivenciar cada movimento com sentido, atenção e poesia traz como consequência a maravilhosa oportunidade de viver. Conhecer profundamente cada passo da nossa caminhada parece ser uma excelente alternativa para nos instalarmos na realidade e amadurecer, ou seja, ver a vida com sentido e resiliência independentemente da situação em que nos encontramos.
Como diz Lenine, em sua música chamada Paciência:
“Enquanto o tempo acelera e pede pressa.
Eu me recuso, faço hora, vou na valsa.
A vida é tão rara”
Sim, a vida é tão rara para não vivermos o mais importante, os processos, o presente!
- Ao querer um bolo, queira mais o processo de cada passo, inclusive as louças para lavar no final.
- Ao querer filhos bem-sucedidos, queira mais o processo de dedicar-se a eles, levá-los ao parque, tirá-los de frente das telas de celular.
- Ao querer um relatório bem escrito, queira mais o processo de escrever, reescrever e refinar.
- Ao querer uma vida mais saudável, queira mais o processo de uma alimentação adequada, de caminhar na natureza, de cuidar de si.
- Ao querer saúde mental, queira mais o processo do silêncio, queira a meditação, queira a terapia.

Então, não existe atalho. Como diz o psiquiatra Saulo Barbosa:
“A certeza do querer é posterior a ação. Quem quer resultado tem que querer o processo”.
Não sei se é sabido por vocês, que leem esse texto agora, mas não podemos controlar os resultados de nossas ações.
E não me olhem com cara de espanto, essa afirmativa carrega uma obviedade imensurável.
Não temos nenhum poder de controlar o fim, contudo podemos vivenciar ativamente os nossos processos, e sabem por quê?
Porque os processos estão sempre no momento presente, que é o único que realmente existe!
Utilizemos o passado para aprender e o futuro para planejar, mas não para viver!
Se os excessos escondem sempre uma falta, penso que o excesso de apego ao futuro e aos resultados se desdobram nas neuroses do nosso tempo, expondo na verdade a falta do que não vivemos.